sábado, 16 de abril de 2011

... completando o capítulo 2

...



    Segundo os dígitos no celular, elas estavam atrasadas. Meia hora, aliás. E aquele ali, na portaria deve ser o Jaime. Alto, olhar fixo atrás dos óculos, dedos entrelaçados, calça jeans e tênis. Uma camisa pólo qualquer. Deve ser o tal.

    É realmente. Elisa, a alta e loira, e boca sedutora, logo apresenta os rapazes, a esclarecer que Elen vai se atrasar. Mais? 

    Abraçada lascivamente ao tal Jaime, Elisa adentra os estúdios, enquanto HD observa as estantes com vinis e compact discs, entre pop australiano, música folclórica irlandesa, timbres tibetanos, punk-rock nova-iorquino, música popular brasileira, violeiros caipiras, sambas populares, reis do reggae, heavy metal norueguês, rock independente francês, canções de protesto italianas, música instrumental indiana, clássicos russos e alemães, mantras e místicas de world music, reis do baião, bossa nova, tropicalismo, rock progressivo húngaro, rock pesado argentino, hinos sacros de tribos amazônicas, entre outros. Mas está atento quando surge o esperado vulto de Elen Lauria.

    Elen chega ao estúdio um tanto apressada, a voz embargada. E nada de esclarecer o porquê de tanto atraso. Exceto para Elisa que já assumira o controle das mesas e botões, fones no ouvido e microfone à disposição.

    Claro que depois, Elen alega a existência de certas visitas inoportunas, mas nada muito esclarecedor. E no mais, ela dá mais atenção ali ao prezado Jaime, enquanto ele pede (solicita gentilmente) um rock made in USA, de preferência de Seattle. HD prefere um pop inglês (só para ser do contra), mas Elisa toca o que quer.

                          “Ei, não consigo encontrar nada no rádio
                           Yo! Mude pra aquela estação...”

                          O mundo está em colapso
                          Ao redor de nossos ouvidos...

    R.E.M. com “Radio Song”, claro. Tratando-se de uma de suas canções prediletas, não é de se espantar. Mas Elen em sussurros com Jaime a um canto não deixa de ser incômodo. Para ambos. E HD não é capaz de entender que as amigas não podem negar atenção a um velho amigo. E fã declarado. E ambas sabem muito bem. No entanto, Elisa não pode negar igualmente o pop inglês, Oasis, com “Stand by Me”,

                               “É difícil quando as coisas não tem sentido”

    Apesar de que há certo sentido no olhar de Elisa, detrás daquele vidro,

                              “Confie em mim – ninguém sabe como será”

e a estrofe se repete, em si mesma à exaustão, mas o olhar de alguém exige atenção,

                                    “Estou cansado de falar ao telefone
                                     Há uma coisa que jamais te darei
                                    Meu coração jamais será seu lar.”

    Talvez seja apenas uma impressão, um curto-circuito no córtex. Afinal, amigos não se encontram todos os dias e outras considerações que visam salvar a auto-estima, ainda mais quando tocam Radiohead, “Creep”,

                                        “E eu gostaria de ser especial
                                         Você é tão especial, ora!”

    Pois é patente e constrangedor a indiferença das garotas quanto a sua presença,

                                      “Que droga estou fazendo aqui?
                                        Não pertenço a este lugar.”

    Ele até sugere que Elisa leia a tradução das canções, mas as meninas acham que seria brega demais, além de assemelhar a certa rádio comercial muito piegas. E tocam um rock pesado do qual ele nada entende, exceto que o vocalista não pretende mudar o mundo. E o silêncio, o seu silêncio, diante do grupo ébrio de gargalhadas. Ele que imaginava ser surpreendido, à portaria, lendo poemas ou encartes de CDs, com viva emoção feminina, depois sugerindo parte da trilha sonora do programa, lendo traduções de clássicos do rock’n’roll, tipo Doors ou Led Zeppelin, comentando o decote de Elisa ou a calça rasgada de Elen, tudo muito empolgante, mas apenas para se afundar em frustrações, como um pobre adolescente.

                            “Pois é uma sinfonia doce e amarga, esta vida
                             Viver com poucos recursos
                             Ser um escravo do dinheiro até morrer”

    Ouvindo The Verve, “Bittersweet Symphony”, Elisa convida os rapazes para continuarem o som em seu apartamento.

                                 “Nenhuma mudança
                                 Eu não posso mudar, não posso mudar,
                                 Aqui estou em meu molde,
                                 Aqui estou em meu molde,
                                 Sou um milhão de pessoas diferentes
                                 de um dia para o outro
                                 Eu não consigo mudar meu molde, não não”


    No caminho, HD seguia silencioso ao lado de Elisa, enquanto Elen seguia abraçada com Jaime, sempre em sussurros. O que tanto comentavam entre risos? Eram assim tão íntimos? Apenas amizade?

    - E esse silêncio todo, Hector!

    Elisa realmente preocupada? Mas por que ele nada sentia por ela? Limitou-se a: - Estou em surto criativo, estou compondo um poema que escreverei daqui a pouco.

    Seu humor sombrio não combina com as gargalhadas dos amigos, mas inegavelmente nasce diante delas. E se pretende presentear as garotas com livros e lapiseiras estilizadas, sua intenção desceu para segundo plano. Pobres garotas fúteis! E ele que já esnobou universitárias!


    No apartamento da Elisa, a TV continua ligada, enquanto HD folheia revistas, ou traduz mentalmente encartes de bandas pop. Jaime apresentou-se para levar Elen em casa, visto ela alegar certa indisposição, “Essa vida corrida, gente!”. E agora HD contava cada minuto, mas o rapaz voltou logo. Elen morava a dois quarteirões e HD poderia até calcular o número de passos. Ela apoiada no amigo, em miríades de futilidades.

    Elisa reaparece na sala, com refrigerantes, e abre a porta para Jaime. Muito falante, o rapaz entra. Sua condição de músico (exímio guitarrista) assim o permite. É um artista, e sua cotação é alta entre as garotas locais.

    Mas Elisa está mais atenta aos gestos de HD, que a surpreende com o livreto do falecido TH, recém-lançado. Jovem poeta que morrera sem divulgar seus versos, mas os amigos não esquecem os seres especiais e providenciaram uma homenagem póstuma, inclusive bancando a pequena edição. E ela pra-lá-de-atenta.

    Enquanto Jaime vai ao banheiro, ela se inclina sobre HD, que respira fundo perfume. Mas não há nada se movendo nele, nem física nem emocionalmente. O que seria totalmente diferente se Elen estivesse ali.


    Para o cúmulo das ironias, quem oferece carona é o tal Jaime. Ser gentil é uma de suas manias.

    - Então você é um cara otimista?

    - Sim, é preciso ser.

    - Concordo, mas em seu otimismo há um tanto de cegueira.

    - E eu acho você um cara estranho.

    - Ainda bem. Imagine se fôssemos todos iguais! E previsíveis! Mas talvez me ache ainda mais estranho, depois da minha próxima pergunta.

    Jaime olha o acompanhante em silêncio. A luz vermelha surge e ele pode voltar o olhar curioso. – Vamos lá, diga.

    - Por que gostamos de X, se nosso sucesso vem de Y? Por que amamos quem não nos ama?

    O rapaz já não disfarça um certo desconforto, um olhar de “Que louco é esse?”. Mas HD não vai parar agora.

    - Mas aí habita a angústia: escolher um caminho e abandonar outros infinitos. Em qual está o sucesso? Quantas oportunidades perdidas! Tanto sofrimento inútil! Eu seria outro hoje se... Amando, sendo amado, com um bom trabalho, talvez casado, abrigando um filho, ou uma filha, seria um outro. E que escolha fiz? Mas será que eu realmente fiz uma escolha? O quanto sou senhor de mim mesmo?

    Cuidadoso no trânsito, Jaime não se voltou. Seus olhos passeavam lá fora, onde talvez houvesse uma ordem. Somente o seu passageiro é que era estranho. Como Elen podia dar atenção a um sujeito desses? Estranho, muito estranho.

    - Não acha esse mundo muito estranho?

    O outro teve um sobressalto. Mas HD não queria que o rapaz se desse ao trabalho de responder. Nem esperou.

    - Moro no próximo quarteirão. Se puder me deixar na esquina, eu agradeço.

    O veículo demorou-se ainda um minuto e depois seguiu. “Quem seria esse Jaime e quem continuaria sendo?”




(Onde se narra o encontro de HD e HL com o editor EP nas noitadas de BH)


    Foi somente uma semana antes do natal que HD e HL reencontraram o poeta e editor que sobrevivera ao assédio da multidão lá na Feira do Livro. EP, Hélio Lúcio conseguiu identificar o vulto.

    Uma noite poética no Matriz, o que não é raro, mas sempre atrai pouquíssimos interessados. Entre eles o poeta e editor que pedia um pouco de atenção enquanto declamava literatura de cordel, não só Patativa do Assaré, mas outros autores, e obras próprias. E era mesmo preciso pedir silêncio. O público nada apresentava do perfil de amante da poesia. HD logo percebeu e desistiu de se apresentar, enquanto Hélio Lúcio já era arrastado por uma fã calorosa, para lançar suas odes simbolistas-expressionistas-pós-modernistas sobre os desavisados.

    É de reconhecimento o mérito de EP em laçar doze minutos da atenção daquele público indiferente, mas Hélio Lúcio surgiu do nada, invocou a presença de um explícito poema erótico e domou a audiência (deixando-a em gozo orgiástico) em cinco minutos e vinte segundos.

    Num canto, HD realmente desistiu de intervir. Suas odes também eram boas, mas ele não estava disposto a desperdiçar voz com ouvidos alheios. Preferia muito mais observar os movimentos táticos de EP que “vendia seu peixe”. Aproximava-se das mesas, recitava m curto poema, ou um trecho de cordel, e estendia o livro para que o cavalheiro presenteasse a encantada dama. Sim, muito grato pela atenção. São apenas dez notinhas, Me agrada muito que a senhora tenha gostado. Mas às vezes, EP “pegava pesado”, Como é, o senhor se esquiva de presentear sua agradável esposa alegando não possuir certo valor, que cada entre nós, é mixaria!? Não seja por isso, eu lhe empresto a mísera quantia! E realmente, “unindo o gesto a palavras”, ele tirava do bolso duas notas de cinco reais e estendia ao cidadão. Um constrangimento. Ou o sujeito sorria ou partia para o tapa. Mas geralmente compravam. Par se livrarem logo do inconveniente vate. Marketing agressivo!

    Bardo discreto, mas não menos esquentado, Hélio Lúcio encerra sua apresentação e vem acomodar-se ao lado de HD e da cerveja. Mas não demora muito e ele se levanta, olhar fixo e vai conferenciar com o poeta e editor à uma mesa de distância. Não demora. Volta e acomoda-se, fazendo suspeita. Prometeu conversar com a gente. Meus amigos poetas, ele disse.

    O jeito é esperar. Sondar o ambiente, comentar o decote da loira da segunda mesa à esquerda, discutir a situação política, um ano de trabalhistas no poder, e daí?, citar o último livro do Chomsky, apresentar-se enquanto defensor das Letras nacionais.

    No meio da segunda cerveja o esperado EP aproximou-se, e pediu outra. Que desculpassem a demora, mas uma agradável (adjetivo de sua predileção!) senhora mostrou-se deveras interessada em suas posições (termo ambíguo, não?) líricas diante da miríade de escrevinhadores (foi este mesmo o termo que ele usou!) modernos numa geração (ambos os significados do termo) de medíocres (dos quais ele mantinha distância, convenhamos) numa terra pobre de mentes esclarecidas (o que não era o seu modesto exemplo), em suma, eis-me aqui para bem servi-los (um tremendo FDP este EP!)

    Quem mais se ocupou de EP foi Hélio Lúcio, preocupadíssimo com as edições hodiernas cheias de mesmices e “dores-de-cotovelo”. HD limitava-se a comentários pouco comprometedores e observar o poeta e editor. Negro, alto, bem vestido, com gosto e modesta discrição, sorridente quando queria, com a mão sempre no lugar certo (e não do jeito HD, a rabiscar guardanapos, rasgar as pontas do menu, despetalar a plantinha no jarro central da mesa) e parando para ouvir (o que muito agrada ao HL, que detesta ser interrompido).

    Até o fim da terceira cerveja discutem a produção editorial e seus mistérios. E EP mostra-se entediado, Que tal uma volta noite a dentro? Acreditam que eu nem jantei?

    Ali mesmo na Praça Raul Soares encontram um restaurante, aliás, um bar modesto, onde, quase meia-noite, podem encontrar um PF. Os amigos agradecem, mas recusam, assim somente EP faz o pedido. Enquanto ele elimina rapidamente o arroz, o feijão, a salada e a coxa de galinha, conversam sobre poesia. Hélio Lúcio recita (mais discretamente devido ao local e horário) suas odes eróticas, e espera comentários de EP, que tem a fama de não fazer rodeios, não ter “travas na língua”.

    - Vocês têm um dicionário aí? Isso de “venusta”, o que é?

    “Ó pobre Hélio Lúcio, ele estará ironizando o teu farto vocabulário, adquirindo por noites inteiras de insônia, lendo poesia simbolista?”

    Hélio Lúcio não exatamente despreza quem tece críticas, mas desde que acrescentem algo. Caso contrário seu desprezo é expressado por seu silêncio. E ele silencia.

    Comendo tranqüilo, EP não faz caso do silencio que se seguiu ao infeliz comentário. HD, que já tirara seus poemas da pasta ao lado, não desiste de apresentá-los. Vejamos o que o juiz tem a dizer diante do corpo em delito.

    Enquanto degusta uma cachaça, EP folheia as folhas xerocadas de HD, que finge meticulosa atenção ao jogo de luzes no espelho do corredor.

    - Este poema é, digamos, gaguejante. – diz EP, a apontar um poema, justamente o primeiro, na primeira folha.


                                       Um suspiro
                                                     rasga
                                                             a noite,
                                      dispersa
                                                   a fumaça do cigarro,
                                      torna audível o silêncio.


    E dedica-se a rabiscar no verso da folha, uma solução para a gagueira.


                                      Um suspiro rasga noite,
                                        Dispersa a fumaça do cigarro,
                                      Torna audível o silêncio.

    E de nada adiantou HD explicar seu processo de composição, ou suas influências de Vladimir Maiakovksi, pois o orgulhoso EP achava que era “gaguejante” e pronto.

    Nada de discussões, meus bons poetas. Que a poesia não vale tanto. Somos três perdidos na noite. Um editor poeta, ou poeta editor, que pensa entender de poesia. Um poeta, ator e performance em busca de um editor, que já gastou todas as suas economias com literatura. Um formado historiador que nunca historiou nada, vive a imaginar-se escritor, nunca concluindo um romance, nunca editando seus contos, distribuindo poemas para os amigos, ciente de que está jogando pérolas aos porcos.

    E assim saem os três frustrados. As coisas não são como relatam os romances. Amizades eternas (e literárias) após uma conversa de bar. Este editor sai sem clientes e estes poetas saem sem um editor. “Da próxima vez que eu precisar ensinar um cara a ler os meus poemas eu prometo que.”





Noites sem Sono


      Foi-lhe dado Tempo para parir o Absurdo, extravagante novo Senso para situar-se num Mundo hostil e hostilizado. Conceber Vida no Seio da Impureza, dar de si o Sentido do qual a Existência carece, o Fôlego de Comoção que removerá as Vestes de prudente Resignação, rasgadas de alto a baixo, deixando entrever Perspectivas na Fenda ferida, entreaberta, gangrenada. Pois os Portais hão de ser franqueados ao acesso dos que procuram, num transbordar de si, num emergir de dentro dos próprios Pesadelos, trançados em embaraçosa Gratuidade, espinhosa Noção de si, perfurando uma fresta no instante de um Cosmos sempre adiante, frenético a criar Ordem nas Entranhas do Caos, que é crescer e definhar, de onde precipita a Consciência a olhar uma mão estéril, dedos ressequidos, a tatearem aflitos pelas Trevas de derramada Noite findante, em falanges esqueléticas como Sombras dançantes, Silhuetas esvoaçantes, remexendo Cicatrizes, num pútrido Charco de Comodidade, enterradas no solo morto da Letargia alérgica a Vórtices de Mudanças, que prefere - incauta - o Senso vulgar, pedra onde se firma o Insensato, Rocha que esmaga o audaz. Tatear, sim, não sem fadiga, não sem Frenesi, não sem sentir-se abandonado num espectral Nada, sepulto num Vale solitário de Dúvidas, a remoer Pesadelos, a remendar Sonhos, especulando Imagens sem corpo nem Alma, Dualidade inútil num cesto de Incertezas, Possibilidades enredadas, Dádivas de finados ideais.


      Quando a Lua fenecer, ele saberá que chorou, que tudo perdeu-se, num êxtase de Tédio consentido, eis agora presa do Desdém, servo da Impossibilidade de aceitar-se, re-situar-se no Borbulhar que brota do sentir-se, Eu e Ele/Ela, distancia regurgitando do Âmago da Indiferença. Eu aqui, Ele/Ela, lá. Amar o Eu que Ele/Ela é. Todos criamos Idéias, e não as negamos, antes para não as perdermos, Fragmentos são compartilhados, em Pensamentos mutilados, e Frases rebuscadas, Gestos desesperados, no lançar-se angustiado rumo ao outro, ouro Pedaço perdido de nós, Ele/Ela, que é nossa Criação, nós que somos Obra dEle, dEla. E assim ainda prosseguir, cúmplice, envergonhado, curvado sob atroz Culpa, ocupado em aliviar sua pobre Consciência, degustando amargo Suor, perpetuando imperdoáveis Crimes, legislando em causa-própria, sustentando corruptos advogados da Auto-indulgência, cicatrizando as Feridas salgadas, cauterizando o Remorso com Penitências. Julgando os Outros pelas suas próprias Renúncias, a confundir Alívio com soníferos, Paz com analgésicos.



(Manuscrito de Thales Henrique, datado de abril de 2002, encontrado por Stevam Lucena. Atualmente integra o espólio do Autor, com a publicação da obra póstuma “Vivendo Ainda...”, em novembro de 2003.)





Na véspera de Natal, HD visitou Elen, desta vez tendo o cuidado e gentileza de avisar antes. Seu presente foi um calendário temático, ainda que ao estender um envelope com poemas próprios ele tenha dito com um sorriso, “Eis o meu verdadeiro presente!”

    Foi a tarde em que ele ousou a leitura de sua adaptação de “Othelo”, de Shakespeare. Estava trabalhando no projeto desde fim de outubro, e somente se aconselhou com o genioso Crânio, a recomendar uma atenta leitura dos originais. Mas a preocupação de HD não era exatamente o texto (ao qual pretendia ‘modernizar’) mas o interesse de sua amada atriz amadora no projeto.

    De início, pode-se dizer que Elen sorriu à proposta (e não havia sorrido a tantas outras?) e deixou-se a ficar a ouvir a leitura e penitente paciência e olhar vazio. Ao fim do segundo Ato é que ousou um comentário de que aquela Desdêmona estava muito “patricinha”. HD até concordou mas esperava algo mais. Ela não tinha sugestões para o cenário? Dicas para o figurino? Não pensou em algum colega do Centro Cultural que se interessaria em algum papel?

    E ela? Caindo de tédio! E ele? De tão confuso e frustrado saiu sem nem dizer “Feliz Natal!” ou “Boas Festas!”


    De qualquer forma, somente Shakespeare poderia agora uni-los. Entenda-se, somente o mundo do teatro poderia. Pois Elen (e Elisa!) explicitaram um certo incômodo com sua presença (suas freqüentes visitas!) na Rádio. “Hector, preciso te pedir uma coisa.” Ele era todo ouvidos. “Quero te pedir para não voltar mais à Rádio, senão a gente pode ter problemas com o Diretor.” E olhava para lisa, e HD olhava para Elisa. Mas o silêncio da outra não era um apoio a uma das partes? E HD percebeu que as duas se distanciavam.

    Meio mundo estava sendo convidado para o projeto da adaptação de “Othelo”, inclusive Hélio Lúcio para o papel do protagonista. Fora outras figuras em ascensão, a incluir o jovem Alberto, que além de ator e performancer, estudava dança. Poderia encarnar o esbelto e sedutor Cássio. E Desdêmona, obviamente, seria ressuscitada pela beleza e juventude de Elen Lauria. Pedra de fundamento da idéia toda!

    Eis a bela aurora do ano de 2004! Ouvindo pop rock na Rádio nas noites de sábado. E ligando para as garotas, a pedir clássicos e progressivos, baladas e até punk rock. Não pode, contudo, deixar de fazer um visita em certa noite de sexta-feira. E ela enroscada no silêncio, e ele insistindo num diálogo que qualquer um podia conceituar como monólogo. E sem conseguir sair do prosaísmo quando ela comenta “hoje a noite está linda”.

    Encaminhavam-se para o portão, ambos percebendo que a visita terminou. Ele buscava exemplos televisivos para ilustrar os próprios sentimentos.

    - Viu ontem a nova minissérie? Os modernistas em São Paulo? Viu? Aquela cena que lembra cena de romance. E na qual a própria atriz lembra disso! Os amantes e os momentos perfeitos!

    Ela ainda mais silente. Eis o portão.

    - Precisamos agendar um passeio. Aqui nada há de romântico. Nada de cenas poéticas. (pausa) sei que nada posso te oferecer. Não tenho poder para fazer despertar em você um sentimento (nem ao menos um por cento do que estou sentindo). Espero que você leia os poemas. É como se eu estivesse conversando com você...

    O silêncio era definitivo. Ela estendeu a mão, que ele aceitou nas suas. Beijou a face amada e se distanciou na noite.


    Ele agenda entrevista com cenografistas, especialistas em vídeo, anota o telefone de pelo menos dois contra-regras, entrega-se a sondagem de possíveis diretores. Pois se o roteiro é por sua conta, alguém precisa cuidar do elenco.

    A primeira diretora agendada havia sido assaltada na tarde anterior e talvez o fato explicasse a pouca atenção, mas ao fim de duas horas de intercâmbio cultural conseguiram chegar a um acordo quanto ao elenco de amadores. Profissionais são caros, profissionais são esnobes. HD a esperar que a peça fosse logo montada e até animado com a possível verba via Fundo Municipal de Incentivo à Cultura, a lembrar o curso com promotores culturais e aquela papelada. Algum problema? Bastaria ligar para o Alfonso Lucena.

    A diretora (com quinze peças no currículo!) indicou uma lista de nomes, entre artistas e produtores, além de professores de arte cênica. Com uma proposta de cronograma de ensaios e pré-produção diante dos olhos, HD tentava conciliar o eu-profissional com o eu-amoroso. Estaria fazendo tudo isso somente para agradar Elen Lauria? Caso a resposta fosse sim, todo o seu empreendimento poderia ir por ‘água abaixo’ diante de um simples “não” da parte dela. Caso a resposta fosse não, ele percebia diante de si um desafio colossal combatendo contra os moinhos gigantes da burocracia e da produção cultural. Seria ele suficientemente profissional para levar tudo até às últimas conseqüências? (Ou somos sempre levados por impulsos passionais?)

    E as tardes desperdiçadas ao telefone fazendo contatos? E aquelas tentando localizar Elen? Telefona para Elen, avisam que ela não está, então ele telefona para Elisa, e ela atende cordial,mas nada sabe do paradeiro de Elen. Uma hora depois, ele liga novamente, Elisa-pura-simpatia atende e comentam fenômenos da música pop. Uma hora depois, nova tentativa para a casa de Elen, ela atende (ufa!) e como ele já sabia, ela não está muito interessada em conversas. Impressão sua, ou em alguns momentos ela é até sarcástica?

    Ele: Eu sou seu anjo. Caí na terra.

    Ela: Eu já vi esse filme. Com Nicolas Cage.

    Ele: na verdade inspirado num alemão, o Win Wenders. Mas não desconversa. Eu sou seu anjo. Vim te ajudar.

    Ela: Até contra a minha vontade? (irônica) E não era melhor continuar anjo? Por que caiu?


    Missão para Elisa: localizar um filme sobre Othelo, de 1998, com o ator Laurence Fishburne, “Sim, aquele mesmo depois no papel de Morpheus em “Matrix – The Movie”. Você que é freqüentadora obsessiva de videolocadoras!” Mas logo o genioso Crânio é quem movimenta-se nos bastidores, cheio de conselhos, em alertas sutis sobre projetos passionais, “Não se ganha a guerra com o coração” e coisas do mesmo naipe.



    Numa quinta-feira à tarde, é Crânio quem telefona. Encontrou a fita. Othelo, USA/GBR, 1995. Diretor: Oliver Parker. HD acerta (eis a agenda ao lado) a visita no sábado à tarde. E encarrega Crânio de convencer as garotas. E ao desligar, HD já está pensando em bombons e flores.

No entanto, como esperado, as cenas de sábado não ocorrem. Sob o sol desgastante, HD chega a casa de Crânio e nada das garotas! E nada de filme. A fita carecia de renovação e o pai fora cuidar dos trâmites. E ninguém avisa! “Mas, Hector, a fita foi alugada na quinta-feira!” Mas HD irritado não ouve ninguém, e discute com o prezado genioso a luta vã do artista, enquanto Crânio (para domesticar o amigo com ares saudosistas) insere no aparelho de vídeo uma fita com shows e clipes do progressivo Jethro Tull.

                                           “Sitting on a park bench
                                     eyeing little girls with bad intent.”

                                       Sentado no banco do parque
                                       Olhando as garotinhas com más intenções.



    À noite, o Pop Rock Show. HD ainda irritado e febril. Telefona para lembra-la que ele existe, solicita músicas (umas baladas românticas ao estilo hard rock dos anos 80, com solos de guitarra longos e lamentosos) e ela logo avisa que está fora d peça. Ele nem acredita, “Que isso! Assim? Pelo telefone? Precisamos conversar com calma.”, como se ela estivesse terminando um louco ‘affair’ que nem começou! Ms ela, irredutível, “Já pensei. É o que quero.” Com frieza bem feminina. E ao fim não tocam as músicas que ele pediu e ofereceu – para elas mesmas!


    Mesmo febril, HD apareceu na casa da Elisa. Domingo à tarde. A irmã aprontando-se para sair com o noivo. Elisa também planejando sair – mas com Elen. E ela telefona, chamando a amiga. Sem dizer que HD está ali diante dela, reclinado no sofá. Conversam sobre a peça, produção porém sem elenco, o que pode fazer? Ela esforça-se por se mostrar interessada, e seguem em comentários sobre a vida acadêmica (ela cursando Publicidade) e HD relembrando fatos e datas de sua própria, ora ou outra tecendo comentários sobre as bandas que se alternam na vitrola (ou melhor, no moderno aparelho de som 4 cabeças com bandeja para seis compact discs), e bem poderiam ser confundidos com um casal apaixonado se ali houvesse paixão ou algum tesão.

    Elen chega, exibindo vestido novo. Surpreende-se com a presença de HD, que se esmera m elogios. Elisa pede licença para ir se arrumar, o que HD interpreta como o melhor momento para sentar-se ao lado de Elen.

    - Qual o aviso que você tem pra mim?

    - Aviso? Nada. Só e disse que estou fora da sua peça.

    - MINHA peça, não! NOSSA. Eu esperava o interesse de todos. Do jeito que você falou (não sei se foi impressão minha) parecia estar se livrando de uma imposição, uma obrigação. Acho que realmente fiquei muito empolgado com o projeto. E fiquei correndo atrás de todo mundo – telefonado, insistindo... Eu custo a me entregar a algo e quando o encontro, fico meio bitolado. Mas e seu silêncio? Você estava ‘fora’ desde o início?

    - Eu achei legal. Mas fiquei pensando. Tem que ser feita com o coração. Agora vou para a faculdade... Não dá tempo.

    - Realmente. É uma peça que pede dedicação. O coração todo. Mas e o seu silêncio? Não dava opinião... Até pensei que sua família era contra. São todos religiosos e julgam o teatro como uma coisa mundana, do demônio...

    - Não, eles até apóiam. Não foi por isso. Eu fiquei calada, mas sou assim mesmo. Na minha. Topetuda.

    (E peituda, ele pensava, atento ao modelito.)

    - Ok. Vamos engavetar a peça. Vamos esquecer a grana que a gente poderia ganhar. Você até compraria um computador e embolsaria umas cinco mensalidades da facul... Vamos esquecer esse 2004 possível. O que será o seu 2004 agora?

    - Estudar, estudar. Faculdade. Cursinho de inglês. Tirar carteira de motorista.

    - Entendo. Eu já pensei nisso tudo. Um tempo atrás. Mas quero pensar em um projeto em conjunto. Você vai precisar de trabalho, daí precisarmos fazer a promoção de algum evento. Música, circo, teatro, exposição...

    Ela o observa com aqueles olhos claros e frios cortando até às entranhas. Ele não suporta e passeia o olhar pela sala. Estante, TV, relógio dentro de um quadro, um ramo de flores artificiais na parede, retratos de crianças num playground, estante, TV, relógio.

    - Eu preciso montar algo. Bem que eu tentei, mas... Meu sonho é montar uma empresa de produção cultural. Gerenciar celebridades. Mas ainda sou muito tímido, muito limitado. Mas tenho os contatos, conheço produtores, promotores, mídia e divulgação. Mas preciso ser mais do que pretensioso...

    Ela folheia letras traduzidas de canções do hit parade. Observa-o, vez ou outra. Ele tenta ser simpático.

    - Eu te entendo, Elen. Você é introspectiva, por mais que se esforce para parecer descontraída.(pausa) E os poemas? Leu?

    - Ah, não. Não tive tempo. Tanta coisa.

    Ele esforçava-se por ocultar a decepção. – Mas deixei poucos. E foi mês passado. Ah! Você não gosta de poesia!

    - Gosto. Gosto sim. Mas preciso estar numa boa, um clima legal, para ler. Estou lendo muito pouco. Tem uns dois livros que comecei e deixei de lado. Desânimo total...

    - Você precisa ler os poemas como se eu estivesse conversando com você. (pausa) Por que acha que eu escrevo?

    Ela, ainda folheando as traduções. – Para desabafar o que não pode expressar, dizer. Deixa no papel as mágoas.

    Ele, sorrindo. – Eu escrevi um poema assim... (pausa) E você, por que escreve? Se sente incompreendida?

    - Não. Eh, sim. Às vezes. Mas escrevo sobre o meu dia, para poder lembrar depois. As coisas que fiz, com quem conversei. Só isso. É que me percebo diferente...

    - Entendo. Nossos talentos nos deixam deslocados, afastados. Mas os artistas se compreendem. Mesmo que não confie a ninguém o que julga intimidades...

    - Não. Nada a esconder. Meu diário fica em cima da cômoda. Qualquer um...

    - Não fica acorrentado e debaixo do colchão? As outras meninas...

    - É íntimo, é coisa minha. E ninguém mexe.

    Antes que o diálogo decline, Elisa reaparece. Cabelos molhados. Mas logo retorna ao lavabo. HD retoma os fios.

    - Seu diário... (pensado alto) Mas, e agenda? Programa, por exemplo, o que vai fazer no dia vinte e oito de janeiro? Dez dias no futuro?

    - Não. Não me preocupo assim com o futuro. Eu até agendava, mas... Gosto de pensar no hoje.

    - No entanto, faz planos para o ano inteiro...

    Ambos se perturbam com a contradição. Silêncio.

    - E o “Diário de Bridge Jones”? Ela começou a escrever um relato íntimo e percebeu depois um caráter, digamos, literário na escrita. E foi um sucesso. Fizeram até filme. Quem sabe o seu diário...

    Surgindo do banheiro, Elisa passa no corredor. Elen percebe. Dá sinais de impaciência.

    Ele insiste. – gosta de comédia romântica? Você viu “Um Lugar chamado Notingham Hill”?

    Ela se levanta, até bruscamente. – Com licença.


    E vai ao encontro de Elisa, no quarto, onde ficam uma eternidade. Ele reclina-se no sofá e fecha os olhos. Esforça-se para não pensar.


                                                “My Heart is broke
                                                 But I have some glue”

                                            Meu coração está partido
                                            Mas tenho um pouco de cola



    Ecos de um Nirvana surgem lá no fundo da mente. Imagina-se diante do Crânio. “Nunca pensei que pudesse me enganar tanto!” E lembra-se até de Marx, que dizia que se o amor não desperta amor no outro, que “se de homem amando não se tornar homem amado” o amor é impotência, inútil tragédia.

    As amigas retornam. Obviamente que os perfumes chegam antes. E que perfumes! E como exageram! Mas não se arrumaram para ele! Não se enfeitaram para ele! “As jovens em flor vão se casar, mas não é com você, não adianta reclamar, não é assim um poema do Drummond?”, ele se dizia, mordendo os lábios. E diante dele uma outra Elen, outra totalmente. Nada de vestido comportado e modos de menina-de-família! E sim uma saia curta, pernas à mostra. (que pernas, meu Deus!) Camiseta curta e sensual (E que peitos, Deus meu!) Provocante. Onde a menina que entrou? De onde surgiu esta mulher?

    HD assim perplexo diante dos olhares de mofa.

    - Eu até acompanharia vocês ao shopping, mas tenho que encarar um compromisso... (Maldita agenda! Faltou dizer. É que faltou voz...)

    Ele diz isso pois sabe que elas JAMAIS vão esboçar qualquer convite, e que todo o estratagema já fora montado para que Elisa apresentasse certo tipo a (outrora) bem-comportada-menina-de-família Elen Lauria.

    Elas se despedem com risinhos vulgares. Ele se afasta.

    - Divirtam-se.




   Querida Elen,

    Janeiro já passou. Cinco meses desde que te conheci, em casa do amigo Wilson, numa conversa de variadas idéias, m pensamentos significativos, você entrou na minha estima.

    Gostei de teu jeito discreto. E mais: teu dinamismo. Onde encontraria uma pessoa assim, que estuda teatro, faz programa de rádio, lê filosofia?

    Foi um encanto, eu confesso. Deixei meu telefone, mas em vão. Casualmente nos encontramos no teatro – e você está com pressa... E passou-se outubro.

    Minha tristeza (e indignação) não suplantou a saudade. Liguei e te convidei para um evento cultural. Mas descobri que sua reserva, seu ar discreto, era desinteresse. Não poderia (nem saberia) despertar em você um afeto por mim.


    Não escolhemos a quem amamos, acontece. E você tão distante.

    Considero-te uma artista, e julgando tua sensibilidade, imaginei que poderia comunicar com meus poemas. Mas você gosta de poesia?

    Propus um projeto audacioso: uma adaptação de Othelo, de Shakespeare. Com poucos recursos, atores amadores, e ‘modernizando’ a peça.

    Mas descubro que você não se importa. Não opina, fica em silêncio.

    Em pleno janeiro e ainda tão estranhos um ao outro. Nem amizade nem nada. A tua amiga Elisa foi até mais gentil.

    Nem se importou em saber quem eu sou.

    Se você esquecesse, por um momento, o teu próprio umbigo, certamente ganharia um amigo.


                                                         De quem muito te estima


                                                                                              Hector
















(fim do cap2 da p3)


LdeM

domingo, 3 de abril de 2011

seguindo no Capítulo 2...

[...]





    Muito gentil, o senhor Alfonso Lucena, ao convidar o colega para uma tarde de distração e discussão literária, em sua residência nas alamedas do Eldorado. HD prontamente aceitou o convite e deixou-se a observar o jovem promotor cultural, enquanto este cuidadosamente relia uma tradução de poemas franceses que o próprio HD concluíra semanas antes. Sim, Alfonso Lucena aprecia Baudelaire, e principalmente Rimbaud, lembrando outras boas traduções brasileiras.

    - Meu prezado, considere que a nossa literatura é sobretudo antropofágica.

    E Alfonso não hesitava em apontar influencias aqui e ali com o mesmo estilo aforístico, curto e direto. Não que fosse dado a slogans, não era publicitário. Mas gostava principalmente da síntese.  Ainda que se entregando a análise de textos e contextos e arriscando-se (ousando mesmo!) escrever crítica literária.

    O curso ao qual se dedicavam, por toda a semana, não serviu apenas para unir as duas mentes, mas apresentou diante dos olhos de HD, impressionado, a figura do poeta performático Leis Macedo, que não se limitava ao papel, mas navegava nas ‘infovias’, distribuindo versos aos internautas. Corpo e lirismo se mesclavam nua personagem carismática que movimentava não só os amadores (e profissionais) da literatura, como o todo cultural da moderna Contagem, onde Macedo se tornara o produtor cultural por excelência.

    Chegou timidamente, mas com os olhos em brilhos sedutores, pesando bem as palavras.

    - Vejo que você capturou a atenção do Alfonso. O que é bom sinal.

    E justamente naquela tarde, Hector Dias (pois ali estava assinado na capa do caderno azul e verde) rabiscou sob o seu nome dois curtos versos,

                                                   olhar solto sobre os telhados
                                                   solto nas alturas do mundo

    E Macedo, curioso, queria mais indícios da culpabilidade poética de HD, que precipitou-se em elogios a Manuel Bandeira e acabou em defesas à Vladimir Maiakovski.

    No entanto, Macedo não apresentava somente versos, mas sobretudo, sinestesia. Explica-se. Em tal persona tudo convergia para a arte poética, seja o olhar, o toque, e gestos, cheiro, traje, posição corporal.

    - Poesia não é papel, não é som. É estar-no-mundo.


    Estava explicada a admiração de Alfonso Lucena pela figura de Leir Macedo, e não menos pela estilística de Carlos Antônio. Se o primeiro gotejava lirismo a cada gesto, o segundo era sobretudo escritor, derramando sílabas e sílabas sobre celulose.

    Via-se que Carlos Antônio não era apenas um sujeito sossegado, como dizia o Alfonso, mas sobremaneira meditativo. Abria a boca somente quando inevitável. E falava pouco. Não que odiasse a oralidade, isso não. Era capaz de recitar longos poemas de cordel, acompanhado por exímios violeiros. Mas a oralidade ra isso: sobretudo arte. E dizia, olhar pousado, “Não desperdicemos as palavras. Um dia elas poderão fazer falta.”


    Naquela tarde, Alfonso e seus amigos foram generosos com um lanche ao estilo tropicalista. Novamente explica-se. Frutas nacionais, bebidas nacionais. Maçã paulista, vinho gaúcho, cachaça mineira. E não hesitaram em abrir o espaço para declamações, mais suculentas ainda. Era inegável o bom gosto de Alfonso Lucena em congregar os artistas de escrita elegante e presença marcante.

    E também mulheres. Poucas e discretas. Assim pareciam inexistentes. Daquelas que pouco falam, por isso amam os poetas, que falam demais. Glória era aquela com ares de anfitriã, até porque ajudara Alfonso a organizar tudo. Assim que HD chegou pôde surpreender o casal num longo beijo, nas pausas da arrumação geral. Alfonso a apresentou sem hesitação, mas esboçou um sorriso do tipo “Você chegou um tanto cedo, hein!”, mas claramente sem recriminação, visto seu tempo todo dedicado a massagear o ego de cada visitante. Sobremaneira atento e totalmente voltado para si. E nem dispensara a gravata. E até um vereador aparecera. Dizia-se que a mãe do mesmo escrevera em tempos outrora versos até consideráveis.

    Inegável que Alfonso fosse um bom anfitrião, isso HD se dizia a cada palavra amável ou olhar de infinda atenção. Olhares destes que somente Alfonso Lucena possuía, daqueles do tipo “Fique à vontade, vamos lá, desabafe, meu caro!” E Glória sempre ao seu lado, expondo os variados desejos dos convivas. Mas a outra garota, de óculos e sem maquilagem, quem seria? Escrevia também, Alfonso revelava. E a outra, magra e introspectiva? Autora de belos poemas e fã de artes plásticas. E assim por diante. Mas nenhuma deu qualquer atenção ao curioso. Pois que recebiam cada apresentação com sorrisos solenes. E seguiam-se. Eis o famoso Carlos Antônio, Prazer em conhecê-lo, tenho lido obras tuas. Oh, isso muito me alegra, não duvido que tenha sido por culpa e cumplicidade de nosso Alfonso!

    Um professor muito sério em suas convicções sobre o multiculturalismo discutia com Leir Macedo. Logo é apresentado o Professor Antunes, da nobre Academia e versado em letras e filosofia política. Sempre emaranhado no próprio raciocínio, o Professor se perdia em pausas e recomeçava em outro ponto, anteriormente abordado, reatando a argumentação com exemplos que pediam novos exemplos.

    Ao seu lado se apresentam estudantes, dos quais HD somente entendeu e conservou os sobrenomes, Ribas e Soares. Entendiam que o multiculturalismo e certa imposição do “politicamente correto” ao contrário de expandir, limitavam a liberdade de expressão com interdições e demarcações demagógicas.

    - Um excesso de “apostos”, de explicações, que não passam de novos véus a camuflarem a feiúra, que substituem rótulos por novas rotulações genéricas. Vejam os senhores, não s diz “favela”, ms “comunidade em risco social”.

    E todos os olhares concordavam com a exposição do Professor Antunes, que acabava de aceitar um suco de manga, servido pela poetisa fã de artes plásticas, logo a perguntar se o escritor Hector Dias aceita uma taça de vinho. Oh, sim, muito grato. Em seguida, tentavam acompanhar as premissas do Professor em deduções, induções e analogias até a conclusão que perdia o efeito não fossem os exemplos.

    O estudante Soares, com forte presença e voz de impor respeito, insistia em que a questão consistia na “imutável sede de poder” e na não menos escandalosa “manipulação dos fatos e eventos” sempre presente na “mídia popular”, que de popular nada apresenta, exceto o baixo conteúdo e estilo, mas imposta de cima para baixo, por “corruptos e corruptores de mentalidade reacionária”.

    E se Alfonso se detinha a ouvir um trecho, logo não podia acompanhar, uma vez que os seus deveres de anfitrião não o permitiam. Mas sabia de antemão que Soares não era “marxista”, mas outro arrivista sem espaço e oportunidade. Fora do jogo e batendo à porta.

    Uma das mocinhas perguntava sobre o irmão de Alfonso, o Stevam, rapaz muito gentil e atencioso. “Inclusive sexualmente?”, o olhar de Alfonso deixava escapar, mas sem mudar o tom de voz ao responder que o irmão raramente se interessava por semelhantes encontros, tertúlias ou festividades outras, mais ocupado em enterrar seus mortos. O que foi difícil de entender, tanto para a mocinha, quanto para o HD que ouvia a conversa em segundo nível, arriscando-se a perder outro sutil exemplo do Professor, que agora abordava os meandros ideológicos da Guerra Civil Espanhola.

    - Uma terra com imperiosa tradição monárquica ser ameaçada por uma república socialista e sem derramamento de sangue? É meio surreal, meu caro! Os senhores me permitam, mas o bolchevismo não se aplica sem sangue, compreendem?

    - Poucos estão dispostos a cederem sua fatia de poder. – se mostrava o estudante Soares.

    - Daí a impossibilidade do socialismo? – a primeira participação do HD.

    - Se considerarmos a propensão humana ao egoísmo e ao aumento do poder sobre os demais. Mas sei que o senhor objetará que não há semelhante “natureza humana” egoísta, ao que argumento que pode até não haver, mas as condições de carência e superabundância, bem como as “posições de hierarquia” e outras burocracias, tal a necessidade de um Estado para melhor distribuir a renda, em suma, tais condições criam um ser humano ávido de poder e para tal não hesita em apelar aos meios mais mesquinhos e violentos.

    - A Espanha viu-se dividida até a medula, e a ‘quinta-coluna’ não foi exatamente um mito, ou figura literária. – com ênfase acadêmica o estudante Soares, enquanto o estudante Ribas limitava-se academicamente a ouvir e elaborar anotações mentais.

    HD percebia em Soares uma certa leitura de História por uma perspectiva maquiavélica, neodarwinista, como se não houvesse alternativas ao que vivemos. E disse o que pensava. Soares não negou, mas apontou certo reducionismo. O Professor continuava a defender o pluralismo e a democracia, não hesitando em atacar a vergonha que era a ditadura em Cuba e lembrar atrocidades dos totalitários, de Auschwitz aos arquipélagos Gulags.

    - Espero que o Professor concorde comigo que o Stalinismo não passou de um Estatismo, ‘fascismo de esquerda’, se permitem a imagem, e não um exemplo de democracia socialista. Sendo até pleonasmo, uma vez que a verdadeira democracia só pode ser socialista.

    O Professor, diante das palavras e da taça erguida de HD, fitou por um instante o olhar na bandeira nacional, que Alfonso deixara ao fundo da varanda. Afinal, em leve inclinação, aceitou o olhar do interlocutor.

    - Meu caro, acho ser desnecessário dizer que democracia pressupõe uma “arena política”, com vários interesses em choque, que se entregam ao diálogo e busca de acordos, mas distantes do consenso, que julgo sempre imposição, mas em diálogo, digo, de interlocutores que representem as reivindicações de necessidades das diversas partes, daí ser “representativa”.


    HD visivelmente concordava, e até aceitava outra taça de vinho, Obrigado, Glória. O Professor, apesar de preso no labirinto, tinha lá suas razões e não seria Hector Dias a provocar qualquer modificação. Ainda mais essa de “consenso, que julgo sempre imposição”.

    - Concordo, Professor, mas o senhor se refere ao socialismo ligando-o a movimentos totalitários, e creio que tal abordagem acaba por deslegitimar a luta por um regime mais igualitário. Não estou panfletando, julgo Stálin no mesmo tribunal ao lado de Hitler e Mussolini, mas sempre lembrando que a Rússia jamais esteve preparada para um experiência socialista e dizer “socialismo real” é panfletar segundo o gosto das direitas.

    - Mas, meu caro amigo, não se trata de esquerdas ou direitas aqui! E o senhor bem vê que não há partidarismos de qualquer espécie em nosso meio. Somos literatos. Inclusive, meu prezado, eis aqui textos de minha autoria, para os quais gostaria imensamente de uma consideração de vossa parte.

    E assim o Professor saiu pela tangente e o grupo se dispersou. Leir Macedo logo fez valer sua voz e presença inaugurando um momento, digamos, mais lírico do que político, e chegando a um consenso, não sem certa imposição, pois o estudante Soares engolia algo a declarar, mas bem acolhido pelos demais, principalmente pelo poeta Carlos Antônio que não demoraria em compartilhar com os convivas o lirismo vivencial de suas lembranças em versos.

    Afonso Lucena aprovou as novas disposições com um gole de vinho.




    Quando Stevam Lucena descobre que Bianca Maria guardou um poema de autoria dele, chamado “Catarse”, sobre a liberdade lírica, um acróstico, na verdade, desde que ele o fixou na parede roxa externa do Matriz, numa madrugada de LEIS DA NOITE, de visitas noctívagas, ele lembra profundamente o show que inspirou o poema, este que o mantém ligado a musa Bianca, que ainda ele ainda nem conhecia.

    Quando o show em suas memórias? Depois da visita ao túmulo de Sônia – o seu passado. Em plena primavera de 2003...


    Foi num crepúsculo que Stevam encontrou o poeta Leir Macedo, o sem travas na língua, não falando sobre poesia, não desta vez, mas sobre políticas culturais, marketing cultural, leis de incentivo, mecenato, lei rouanet, produção cultural, sei lá mais o quê cultural, agitando (suas mãos agitadas) no ar tanto cenas cinematográficas quanto gestos teatrais, atraindo a atenção dos transeuntes testemunhando dias de fadiga.

    Mídias à parte, veio um show de todas as mídias. O folheto de divulgação já trazia música, poesia, teatro, magia, performances, circo, fogo, terra, água, ar, ritual, flores, máscaras, anjos, cheiros. No palco em trevas engolfantes, o contraste de um trapézio vermelho, ou bonecos numa escada, um tecido branco, espectral (um cortinado enrolado) caído do teto. Um palco entulhado de instrumentos, preenchido por incenso e velas acesas. Uma voz. Voz das profundezas.

    Apresenta o vento, aquela voz lá do fundo, enquanto uma nuvem de incenso se eleva – uma densa névoa – paira sobre o público, vem perfumar os pulmões estressados.

    Surge uma bailarina, bailando entre as nuvens de incenso, com sua face angelical, os pés flutuando na leveza dos passos. Então, da penumbra, surgem bolas de fogo – a voz exalta o fogo, o ardor, o amor – que giram e giram, num carroussel de línguas de fogo ferindo as trevas do palco – e um solo de piano – e um também surdo – e um poema algo pagão...

    Dois outros músicos se fazem presentes, um baixista e um guitarrista, todos de vestes sombrias, faces pálidas, expressões soturnas. Logo a vocalista – que a pouco brincava com fogo – entoa uma canção triste, tristonha, em voz melancólica, e cai ao chão em gemidos atrozes!

    As canções refletem a sonoridade e a aspereza da língua anglo-saxã, mas as poesias se elevam em bom português, quando a vocalista começa a declamar, assim um pop inglês sombrio, as baladas de Morrissey, as imagens doloridas de um The Cure, mesmo algo intimista como um Radiohead...

    Uma bateria eletrônica (tocada com perícia pela exímia percussionista) torna o clima ainda mais pesado. Entoam a bela – e triste – Rosa de Hiroshima, “Sem cor, sem perfume, Sem rosa, sem nada”, quando dilaceram uma rosa vermelha – no palco, cortando-a pela haste. E oferecem, “Sem rosa, sem nada.”

    Uma pausa. Aplausos. Stevam acorda do transe ao ressoarem, ao seu lado, as palmas de Leir Macedo.


(O poema foi escrito uma hora depois, e divulgado entre poucos. A cópia derradeira ficou com Bianca Maria, que se apoderou da mesma na parede roxa naquela madrugada do ‘Leis da Noite’. Bianca que ainda conheceremos dois anos depois.)





     Em fins de novembro, no auditório da Prefeitura, o lançamento da obra inédita de TH. Sem a presença de qualquer familiar, sem a aparição de qualquer vulto noturno, somente os tradicionais grisalhos da Sociedade Literária, que almejavam um evento político, visto o convite ao prefeito. O fato é que o próprio nem compareceu, enviando um representante.

    Nada de excepcional, nada que fugisse ao cronograma (cuidadosamente esboçado e distribuído por HD) e por isso o evento teve o mérito de ser comum. O que certamente não agradaria ao homenageado TH.

                                      Tal um pântano de lágrimas borbulha
                                  O íntimo furor em sorrisos falsos
                                      Dentro queimam indigestas verdades

    Stevam se angustiava, indagando se estaria fazendo a coisa certa. Talvez os poemas devessem mesmo mofar, e os versos tornarem-se pó disperso no vento. Mas e se ele fosse um outro Max Brod, que divulga ao mundo um genial Kafka?

    HD até entediado nos bastidores. Convidou Elen Lauria, que nem se dignou a inventar desculpas. Muda, muda ao telefone. Agora ele observa a filha da Diretora, com seu corpinho fascinante num vestido branco e com sandálias translúcidas.

                                       Mentes perdidas com olhares severos
                                     Exigem uma trilha para além da dor
                                     Um caminho batido até a esperança

    Na mesa de entrada, um caderno com cento e dez assinaturas somente registrando-se a venda de vinte e dois exemplares do soturno “Vivendo Ainda...”. Também havia um buquê de flores, caso surgisse a irredutível tia do falecido autor. Alfonso fizera um acordo com a anciã, e enviou um convite. Mas tudo em vão. A tia, mesmo desconfiada, deu crédito à versão de Alfonso, que insistira em que TH delegara os poemas para o amigo Stevam, antes de morrer. Ninguém estava animado a responder processo por invasão de domicílio.

    Na cerimônia, sem muita pose, HD declama o poema-título, na abertura, e Stevam convidou uma atriz, que encantou a todos com uma performance lírica de um poema imagético de sentimental visão feminina.

                                    E evitar a colheita de íntimas mágoas
                                    Junto ao maculado mármore das lápides
                                   Pranteando a medonha ruína da carne

    Stevam até que achava estranho, esta exposição de versos que somente ele conhecia, sussurrando-os ao vento, quando perambulava solitário, dormente a dormente, seguindo os trilhos da ferrovia.

    Mas ele se lembra, uma tarde rabiscou um soneto, uma homenagem póstuma, para Sônia Regina.

                                   Incertezas sob as asas da tristeza
                                   Vivendo uma ilusão assim tão estranha
                                   Atormentadas visões guiam os passos.



(Nota: o poema “Vivendo Ainda...”, manuscrito, em folha ofício, é considerado o último poema de TH, que passou a limpo em cuidadosa redação uma boa parte de seus textos, no anoitecer de 31 de dezembro de 2002, horas antes de se matar.)




(do diário de Stevam Lucena)


    26 out

    Ontem outra daquelas festinhas do meu irmão. Preferi ir ao cemitério. Saí cedo. Nem vi ninguém. Família é um fardo sobre a gente.

    Diz que é importante a vida social. Mas sei que vive pelos cantos. Vivemos de uma contradição. Pai marxista. Mãe esotérica. Nem materialistas, nem espiritualistas.

    Diz que é para divulgar a poesia, mas ligam o som e tentam agarrar as mocinhas. Desculpas de literato. Vive achando que é o mais responsável. E eu sendo mais velho deveria ser mais sociável. Que eu é que deveria enturmar com os lumes de nossa high society.

    Claro que agradeço sua ajuda aí no lançamento do TH, mas ele faz chantagem velada, isso eu sei. E fica me culpando por eu ter saído da faculdade. Ele entre a literatura e a sociologia.

    Estou com sono. Desde ontem sinto o cheiro de flores mortas.



    06 nov

    Fui ontem ao Leis da Noite, aquele evento sombrio no Matriz. Colei na parede externa uns poemas, uns quinze. A maioria do TH. Uns nove. Meus, o restante. E encontrei o Stevam, o meu xará moreno e irônico. Estava atento aos vultos das vampirinhas.

    Poucos se aproximaram para ler os poemas. Lá dentro havia um sarau mas eu não pagaria para entrar. E o importante é divulgar o lançamento do opúsculo do TH. Não podemos deixar estes poemas enterrados com o autor.


    Nov (o dia??)


    Ainda lendo e relendo os papéis do TH. Toda essa loucura que ele escrevia, e anotava em papéis soltos, sem qualquer ordem. Escrevia em suas andanças, escrevia na penumbra do quarto, ou na solidão das suas noites acordadas (palavra riscada) insones.

    O que ele fazia? Se expressava o que mais poderia fazer? E imagino o próprio TH zombando de tudo e de si mesmo. Zombando? Não, lamentando.

    Se expressando? Nossos humanos, demasiadamente humanos, se expressam, e como se expressam! Deixam transbordar seus egos inflados, e inundam o mundo, as páginas e as telas, com suas confusões e expressões, com seus manifestos e suas retóricas, com suas preces e suas palavras de ordem, com suas metafísicas e seus epitáfios, com suas performances chocantes, com suas músicas ligeiras, suas idealizações e delírios de poder, com seus suplementos literários e seus planos de governo, com suas revistas em quadrinhos e seus jogos eletrônicos, com suas fotos pornográficas e seus desenhos a bico de pena, com seus tratados d auto-gestão e seus comitês de salvação pública, com suas denúncias de devastação ambiental e seus manuais de auto-ajuda, com seus tambores e batuques e seus vestidos, anéis e braceletes, com suas ambições de sucesso e seus quinze minutos de fama, co suas utopias e massacres em nome da fé, com suas agonias e desejos, com suas flagelações em público, com suas risadas histéricas, com suas confissões na rede virtual, com suas tatuagens de violência colorida, seus piercings e auto-mutilações, com seus fanatismos e piedosas exibições, com seus corpos à venda, com seus corpos em chamas, com suas maquilagens e máscaras, com seus carros do ano e celulares com câmera digital, com suas coberturas na zona sul e seus casebres na periferia, com suas enxaquecas e dores de dente, com seus cadáveres e suas invocações, com seus entes queridos e seus ectoplasmas balbuciantes, com suas greves de fome e suas corrupções sempre negadas com seus terroristas e líderes religiosos, com suas bombas e lágrimas, com seus sonhos e pesadelos

(texto incompleto, não-concluído)


    22 nov

    Cheguei cansado. Maratona e tanto. A sorte está lançada. O livro do TH está oficialmente em mãos públicas. Espero que seja respeitado. Sou suspeito ao elogia-lo, mas ali há talento.

    Alf estava sério, do jeito que gosto. Sem gracejos. E o produtor, o Hector, surpreendeu com eficiência. Manteve a coesão do grupo e me salvou do desespero. Serei grato.

    O que mais posso escrever? Vou dormir um pouco, com o sossego de um dever cumprido.

    TH será lembrado.





continua...


LdeM